Queremos ser protagonistas da indústria 4.0

Fabricante de equipamentos elétricos, gigante catarinense Weg vai vender, pela primeira vez, soluções industriais baseadas somente em software

Uma das poucas empresas brasileiras do setor industrial voltadas à exportação – no ano passado, 57% das receitas de quase R$ 12 bilhões da empresa vieram do mercado externo –, a catarinense Weg também investe pesadamente em pesquisa em desenvolvimento.

No ano passado, foram mais de R$ 300 milhões. Segundo o presidente da companhia, Harry Schmelzer Jr., que está no cargo desde 2008, a companhia fez transformações em seu negócio nos últimos três anos que agora vão culminar em uma mudança importante: a primeira oferta exclusivamente de software da companhia.

Depois de comprar duas companhias de tecnologia – uma voltada a softwares de gestão industrial e outra de internet das coisas –, a empresa se prepara para aplicar gestão de dados e inteligência artificial à medição do desempenho de seus motores e também à administração de grandes indústrias.

“Vamos vender só software. A empresa poderá pagar por mês ou por ano, como serviço. E os módulos de manutenção da Weg poderão ser acoplados a outros sistemas do mesmo tipo”, diz Schmelzer Jr.

Além da busca por aquisições, que deverá continuar também no exterior, essa atuação mais digital também afetou o centro de treinamento de profissionais da Weg – que forma por ano 200 jovens entre 16 e 18 anos.

De algum tempo para cá, diz o presidente da companhia, novas disciplinas foram adicionadas à capacitação, que antes era focada em trabalhos industriais. Agora, mesmo quem está sendo treinado para trabalhos manuais precisa entender softwares de gestão e ter noção de inteligência artificial.

Essa equipe com novas habilidades – o RH da Weg está de olho na captação de cientistas e arquitetos de dados – ajudará a alavancar o objetivo da companhia de comandar a instalação de uma base industrial mais moderna no País.

“Primeiro vamos focar as indústrias nacionais e depois vamos para exterior”, afirma. “Queremos ser protagonistas da indústria 4.0 no Brasil.”

A Weg é conhecida por seus equipamentos. Como ela está trabalhando para embutir tecnologia em suas soluções?

No setor de automação industrial, existe a necessidade de os processos da companhia se comunicarem mais, de forma integrada. Quando você faz um planejamento de uma fábrica, com o chamado RP, que é um software para este fim, você tem informações que já existem e, à medida que a fábrica continua a funcionar, novos dados são agregados.

E aí eu posso ter informações em tempo real sobre a fábrica, e não só o fechamento diário ou semanal. E isso serve para planejar e prever eventuais problemas. A automação está entrando também em um software de gerenciamento de sistemas de fábrica – o que já é uma demanda global, embora seja ainda incipiente no Brasil. Tudo em busca da produtividade.

E nos motores, outro grande negócio da Weg?

O motor elétrico é usado para o funcionamento de indústrias de processos – como a de papel e celulose e as siderúrgicas, por exemplo. E hoje está mais barato para se analisar e armazenar dados em nuvem. Com isso, o motor avalia a própria performance – e pode prever o surgimento de algum problema, como uma sobrecarga ou o desagaste de determinadas peças.

Dessa forma, você passa a não ser surpreendido com paradas não previstas. O “motor scan” gera informações de modo permanente. Você tem dados sobre o motor em tempo real. Numa indústria de mineração, por exemplo, o pó do minério pode sobrecarregar os rolamentos. E esse sistema consegue fazer esses alertas, com inteligência artificial.

Ou seja: a tecnologia vai evitar paradas nas fábricas.

E também fazer predições. O algoritmo vai “aprendendo” aos poucos. Isso traz previsibilidade à gestão de ativos, que ficará muito melhor. Uma fábrica precisa ter a melhor eficiência operacional dos ativos e das pessoas. E você consegue isso utilizando melhor os recursos. E tudo isso vai vir por meio da digitalização da automação.

A Weg fez duas aquisições recentes de empresas de tecnologia. A ideia é ter o software cada vez mais combinado com os equipamentos da empresa?

A Weg comprou a PPI-Multitask, especializada em execução de sistemas de manufatura e internet das coisas para a indústria. É um negócio novo para nós. A Weg sempre fez software de automação industrial na base, aplicados ao hardware.

Mas agora outra coisa vai acontecer, pois todo esse sistema de supervisão de motores poderá ser feito em um aplicativo, vai para uma plataforma digital. E, a partir disso, vamos vender só o software, de diversas formas.

A empresa pode comprar ou pagar por mês ou por ano, o chamado software como serviço. E os módulos de manutenção da Weg poderão ser acoplados a outros sistemas do mesmo tipo, e nós recebemos pelas nossas soluções.

E isso pode ser usado em outros segmentos, além do industrial?

Sim. Outro negócio da Weg é o de eficiência energética. Sugerimos às empresas formas de melhorar o consumo de energia. Isso também pode virar um aplicativo pago como serviço, por meio de assinatura.

Temos um exemplo hoje na indústria solar. Nos painéis solares, fornecemos aos clientes de autogeração a tecnologia que permite o acesso a informações sobre o funcionamento do sistema. Nos grandes parques solares, a situação é diferente.

Podemos vender apenas um software complementar para ajudar na manutenção. Em parques eólicos, a Weg tem um negócio especializado em manutenção – garantindo a gestão integrada de ativos espalhados por vários locais do País. É um mundo que já está aí.

Vocês também compararam a V2Com, de internet das coisas. Como isso se encaixa na estratégia da companhia?

O que está crescendo hoje no mundo? Internet das coisas, big data e computação nas nuvens. É um pacote de tecnologia. A automação da indústria é um processo, não vamos pular diretamente para a indústria 4.0. Para chegar lá, precisaremos de uma gestão de informação mais eficiente, de mais capacidade de decisão.

A V2Com é a internet das coisas, o que nos permite acoplar sensores aos equipamentos para garantir novas coletas de dados. A gente vai ajudar o cliente a medir o que ele não vinha medindo. Vamos fazer isso tanto com hardware quanto com software. E vamos padronizar todas as informações para que isso possa ser acessado em uma linguagem só. A V2Com vem nesse pacote.

SAO PAULO ECONOMIA NEGOCIOS: Harry Schmelzer Jr, presidente da Weg, engenheiro eletricista pela Faculdade de Engenharia de Joinville (FEJ), com pós-graduação em finanças pela Escola Superior de Administração em Gerência (Esag), além de cursos de gestão e finanças em instituições como Fundação Dom Cabral (FDC), Kellogg School of Management (EUA), Insead (França) e IMD (Suíça). Na empresa desde os anos 1980, Schmelzer Jr. foi diretor das divisões de acionamentos e motores. É o primeiro presidente executivo da Weg que não vem da família de fundadores da companhia. Está à frente da companhia desde 2008.
FOTO: Rodrigo Arsego / Weg

A Weg ainda está buscando aquisições, dentro e fora do Brasil?

Para o mundo da indústria 4.0, a Weg olha empresas de fora do País. Elas têm os recursos humanos, de cientistas e arquitetos de dados. No caso da PPI-Multitask, optamos por uma empresa brasileira que tem alguns anos de experiência, que conhece melhor o status de adoção de tecnologia pelas indústrias nacionais. Ela tem um software que pode ser aplicado em todos os níveis de indústrias.

Você pode começar a jornada (rumo à digitalização) em qualquer momento, pois se trata de um sistema modular. Já a V2Com veio principalmente dentro do projeto de ajudar na gestão de ativos do setor de energia elétrica e também porque a Weg quer participar da implantação da indústria 4.0. Primeiro vamos focar as indústrias nacionais e depois vamos para exterior.

E a ideia é começar essa oferta pelo Brasil, como uma espécie de laboratório?

Sim, porque temos de ganhar experiência e criar mais soluções. Para isso, vamos escolher alguns mercados e depois escalar internacionalmente.

O sr. acha que haverá uma mudança estrutural, como no tipo de pessoas que a Weg vai querer atrair?

Os produtos que agora estamos colocando no mercado, começamos a experimentar em tecnologias que usávamos dentro de casa. Além da compra que fizemos, temos um sistema de monitoramento de manufatura próprio da Weg. Agora, estamos na fase de transformar essas inovações em negócio. Por isso, precisamos ajustar o nosso centro de treinamento, que agora também treina cientistas de dados.

Buscamos outras formações. Temos meninos e meninas de 16 anos que já entram para aprender sobre inteligência artificial. É uma nova realidade dentro da escola técnica da Weg, há pelo menos uns três ou quatro anos.

Ou seja: antes as pessoas aprendiam trabalhos industriais e agora estão mais voltados à tecnologia?

Sim. Continuamos a formar também os profissionais tradicionais, mas eles passam a atuar com novas ferramentas, têm de ter noção de inteligência artificial, dominar determinadas linguagens de software. Eles também passam por um treinamento de tecnologia.

No ano passado, a Weg investiu mais de R$ 300 milhões em pesquisa e inovação. Isso tende a crescer ao longo do tempo?

Se pudesse resumir o sucesso da Weg, escolheria três vertentes: desenvolvimento das pessoas, inovação e tecnologia e foco na exportação. A Weg tem feito investimentos consistentes em inovação, mesmo em tempo de crise. E temos de entrar o tempo todo em novos mercados.

A gente avança na China, nos EUA e também no Brasil. E buscamos novos negócios, em energia eólica, solar e agora estamos indo para a gaseificação de lixo. Estamos também em mobilidade elétrica, trabalhando em motores para caminhões e ônibus.

E estamos entrando também em indústria 4.0, a partir da evolução da capacidade que a empresa já tem. Nossa visão é a de manter essa jornada, sem projetos mirabolantes. Queremos ser protagonistas da indústria 4.0 no Brasil.

Texto: Fernando Scheller

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